Ideoplastia
O vocábulo ideoplastia foi criado pelo Dr. Durand (de Gros) em 1860, para designar os principais caracteres da sugestibilidade.
Mais tarde, em 1864, o Dr. Ochorowicz o empregou para designar os efeitos da sugestão e da auto-sugestão, quando ela faculta a realização fisiológica de uma idéia, como se dá nos casos da estigmatização.
Finalmente, o Professor Richet o propôs, quando das suas experiências com as senhoritas Linda Gazzera e Eva C.. (1912-1914), cujas experiências demonstraram, de feição nítida e incontestável, a realidade da materialização de semblantes humanos, que eram, por sua vez, reproduções objetivadas e plásticas de retratos e desenhos vistos pelos médiuns.
Claro é que, desses fatos, dever-se-ia logicamente inferir que a matéria viva exteriorizada é plasmada pela idéia.
E aí está a exata significação do termo ideoplastia, aplicado aos fenômenos de materialização mediúnica.
E a substância viva, exteriorizada e amorfa, sobre a qual se exercem as idéias forças, inerentes à subconsciência do médium, foi designada por ectoplasma, pelo mesmo Professor Richet.
Em homenagem à verdade histórica, devo consignar que as materializações ideoplásticas já eram conhecidas de meio século antes e despertaram de modo especial a atenção dos investigadores.
Quanto à substância ectoplásmica, essa era já conhecida dos alquimistas do século XVII, assim como de Emanuel Swedenborg.
Efetivamente, o Dr. N. B. Wolfe fala longamente de materializações ideoplásticas, na sua obra: Starting Facts in Modern Spiritualism (1869).
De substância ectoplásmica falam dois grandes alquimistas, quais Paracelso, que a denominou Mysterium Magnum, e Tomas Vaogan, que a definiu por Matéria Prima.
Este último tinha-a provocado pela transudação do corpo de sua mulher.
Quanto a Swedenborg, parece que experimentou consigo mesmo, visto que, em sua primeira visão iniciática, nos fala de “uma espécie de vapor que lhe saía de todos os poros, um vapor d'água assaz visível, que descia até roçar no tapete”.
Ainda que de ideoplastia não se falasse senão mais tarde, depois de alguns anos, ela estava realmente subentendida, desde a época em que se obtiveram os primeiros fenômenos de materialização, visto que os fantasmas materializados apareciam envoltos em véus, o que demonstra que o pensamento e a vontade são capazes de plasmar a matéria, criando tecidos.
Pouco importa fossem pensamento e vontade agentes atribuídos a defuntos ou a vivos, de vez que, em ambos os casos, se tratavam, a despeito de tudo, de uma forma plástica inerente à idéia.
Na ordem das manifestações naturais, sejam fisiológicas ou patológicas, sempre se conheceram categorias de fenômenos que deveriam fazer pressagiar a existência de propriedades plásticas e organizadoras no pensamento e na vontade subconscientes.
Assim, por exemplo, no caso do “mimetismo” de algumas espécies animais, e nos de “novi” e estigmas, da espécie humana.
Limitar-me-ei, nesse sentido, a transcrever uma página do Dr. Gustave Geley, na qual se encontram ligeiramente resumidas essas manifestações.
Em seu livro Do Inconsciente ao Consciente, escreve ele à pág. 63:
“Os fenômenos de estigmatização, de modificações tróficas cutâneas por sugestão, não passam de fenômenos elementares de ideoplastia, infinitamente mais simples, posto que da mesma ordem, que os fenômenos de materialização.
As curas ditas miraculosas são frutos da mesma ideoplastia, orientada por sugestão ou auto-sugestão, num sentido favorável às reparações orgânicas e concentrando em tempo dado, nesse sentido, toda a potencialidade do dinamismo vital.
É preciso notar que a força ideoplástica subconsciente, reparadora, é muito mais ativa nos animais inferiores do que no homem, e isto indubitavelmente porque, neste último, a função cerebral avassala e desvia, a seu proveito, a maior parte da força vital.
Não há nenhum milagre no retorno acidental à organização humana, de ações dinâmicas e ideoplásticas, que constituem regra na base da escala animal.
Os fenômenos de mimetismo, tão uniformemente freqüentes nos animais quanto misteriosos em seu mecanismo, também se podem explicar pela ideoplastia do subconsciente.
O instinto provocaria, nesse caso, simplesmente a ideoplastia num sentido favorável, e os efeitos desta última seriam, a seguir, facilitados e fixados pelos fatores de seleção e adaptação.”
Por fim, é oportuno acentuar que, se a hipótese ideoplástica se impôs de modo definitivo em virtude das experiências com os médiuns a que nos temos referido, ela já era prevista por intuição científica de diversos investigadores, tais como Hartmann, Aksakof, Du Prel e o Cel. de Rochas.
Os três primeiros abordaram-na como “hipótese de trabalho” apenas, ao passo que o ultimo já a expende baseado em suas próprias experiências com Eusápia Paladino.
Assim é que, diz ele:
“Outras experiências ... tendem a provar que a matéria fluídica exteriorizada pode modelar-se sob a influência de uma vontade assaz poderosa, tal como a argila nas mãos do escultor.
Podemos presumir que Eusápia, depois de passar por diversos centros espíritas, concebeu na sua imaginação um John King, de expressão bem definida, e não só lhe toma a personalidade verbal, como também consegue imprimir-lhe formas orgânicas, quando produz a distancia, sobre argila, impressões de cabeças humanas, a exemplo do que sucedeu na Itália.
Nem outra origem teria tido o fole visto pelo Sr. de Gramont, de vez que não é mais difícil representar um objeto qualquer, do que representar um membro do corpo humano.
Mas, se nada nos prova que John existia também nada nos foi provado em contrário.
De resto, assim pensando, não somos únicos no mundo.
Pessoas outras conheço eu, absolutamente fidedignas, e que relatam fatos que se não podem explicar senão com o auxílio da posse temporária do corpo fluídico exteriorizado, exercida por uma entidade inteligente, de origem desconhecida.
Tais as materializações de corpos humanos integrais observadas por Crookes com a srta. Florence Cook, por James Tissot com Eglington, por Aksakof com a Senhora d'Esperance.” (Anais das Ciências Psíquicas, 1897, págs. 25-26)
Pode-se ver, assim, que desde 1896 o Cel. Rochas não só tivera a intuição da hipótese ideoplástica, como também a circunscrevera a justos limites, sabiamente advertindo que, se devemos admitir a existência de fenômenos que permitem atribuir ao pensamento subconsciente do médium uma energia plástica e organizadora, demonstrado estão, igualmente, que fenômenos outros há, cuja explicação se torna impossível, desde que se não admita a intervenção de um pensamento organizador, estranho ao médium e aos assistentes.
Hoje, mais que nunca, esta é a verdadeira e única solução do enigma assaz complexo.
À proporção que avançamos na investigação dos múltiplos ramos que constituem as doutrinas metapsíquicas, vemos ressaltar, de mais a mais, a grande verdade do princípio segundo o qual Animismo e Espiritismo são complementares recíprocos, tendo ambos uma causa única: o espírito humano, que encarnado produz fenômenos anímicos e desencarnado determina fenômenos espíritas.
Isto é tão verdadeiro que, quando se pretende contestar uma ou outra das modalidades que perfazem o problema em equação, torna-se literalmente impossível explicar o conjunto dos fatos.
Isto posto, preliminarmente, prossigo no meu propósito, não sem prevenir aos meus leitores que pretendo fornecer-lhes uma simples e sumaríssima exposição dos fenômenos ideoplásticos, de vez que o tema é assaz vasto para ser devidamente desenvolvido em uma hora de síntese geral, como esta.
Por outro lado, trata-se de investigações tão recentes e tão largamente discutidas nos tratados e revistas especializados no assunto, que todos os metapsiquistas as conhecem.
Relativamente à natureza do ectoplasma, reporto-me às passagens essenciais da descrição que dele faz o Dr. Geley, nos seguintes termos:
“O processus da materialização pode ser resumido da seguinte forma: Do corpo do médium transpira e exterioriza-se uma substância amorfa ou polimorfa, que toma representações diversas, ordinariamente de órgãos mais ou menos completos.
Substância móvel, ora ela evolui lentamente, sobe, desce, resvala sobre a médium nas espáduas, peito, joelhos, em movimentos coleantes que lembram um réptil, ora por bruscas quão rápidas evoluções, aparecendo e desaparecendo como relâmpagos...
Essa substância apresenta grande sensibilidade, aliada a uma espécie de instinto, comparável ao instinto de conservação dos invertebrados.
É qual se tivesse a perfeita desconfiança de um animal sem defesa, ou cuja única defesa consiste em reentrar no corpo do médium, que lhe deu origem.
Assim é que teme os contactos, sempre pronta a ocultar-se e reabsorver-se.
A sua tendência para organizar-se é imediata e irresistível, pois não permanece muito tempo no seu estado original.
Freqüentemente, essa organização é tão rápida que não deixa ver a substância primordial.
Outras vezes, são vistas simultaneamente a substância amorfa e representações mais ou menos completas, englobadas em sua massa, como seja um dedo, entre franjas de substância.
Outras vezes são cabeças, e os rostos que na substância aparecem envoltos.” (Do Inconsciente ao Consciente, págs. 53-58).
Por sua vez, a srta. Felícia Scatcherd assim se refere à atitude do ectoplasma, no curso de uma das suas numerosas sessões:
“Almoçamos com Marta (Eva C...) e, quando terminamos o almoço, ela manifestou o desejo de me proporcionar uma sessão.
Resistia-lhe ao propósito, no temor de fatigá-la, mas, tal foi a sua insistência, que a Sra. Bisson acabou intervindo e opinando que melhor fora não lhe contrariar os desejos.
Iniciado o trabalho, a médium caiu logo em profundo transe, cabeça pendida para trás, de modo que nada lhe seria possível perceber na sua frente, ainda que acordada estivesse.
Abertas ficaram as cortinas do gabinete mediúnico, cuja luz baixamos um pouco.
Ainda estávamos conversando, quando, de repente, vimos aparecer no assoalho abundante massa de substância, cerca de 18 polegadas distante e à esquerda da cadeira da médium.
Essa substância era de alvura extraordinária e ligeiramente luminosa.
De mim para mim, pensei: “Como se pode produzir semelhante coisa? Quem sabe se essa substância está ligada à médium?”
E o controle da médium logo respondeu à minha pergunta mental, dizendo: “Não há ligações quaisquer; pode passar a mão entre a substância e o corpo da médium.”
Assim o fiz, sem inconvenientes.
Depois, coloquei um lenço branco, perfeitamente limpo, ao lado da substância, a fim de lhe avaliar a alvura e verifiquei que o lenço me parecia antes cinzento, comparado à substância misteriosa.
Coloquei-me, depois, à feição de poder tocar a substância sem ser vista, mas, quando estava a pique de o fazer, todo o corpo do médium se contorceu em convulsivo espasmo, e o controle exclamou:
– “Não me toque, não me toque, porque me mataria!”
Arrependida da tentativa inconsiderada, humildemente procurei desculpar-me.
Todavia, mais tarde, espontaneamente me autorizaram esse toque, e assim constatei que essa substância oferece certa resistência ao tato, comparável à clara de ovo.
E quanto à sua temperatura, pareceu-me um pouco inferior à do ambiente em que nos encontrávamos.
Seria interessante pesar essa substância, disse eu à Sra. Bisson, mas compreendo, ao mesmo tempo, que se nos torna impossível fazê-lo, de vez que o seu manuseio pode prejudicar a médium.
Sorriu-se a Sra. Bisson e, dirigindo-se à filha, pediu-lhe fosse à cozinha buscar uma balança.
Nesse comenos, a mágica substância alongou-se, tomou a forma de um réptil, de onde concluo houvesse compreendido o que dela pretendíamos.
Chegada a balança, foi-me dado experimentar uma das mais fortes emoções da minha vida.
É que a substância, qual serpente que se levantasse sobre a cauda, viera colocar-se num dos pratos da balança, que estava sobre um pedestal, na altura de 28 centímetros do assoalho.
E ali permaneceu todo o tempo necessário à verificação do seu peso, por mim julgado levíssimo, em relação ao volume.
Serpeando depois para trás, deixou o prato e baixou ao assoalho, para retomar o primitivo aspecto informe.
Depois, enquanto a observava, sumiu-se. Não se retraiu, não se dissolveu; simplesmente – desapareceu.” (Light, 1921, págs. 809-810).
Seria inútil perdermo-nos em conjeturas sobre a natureza dessa substância viva, sensível, inteligente, capaz de aparecer e desaparecer num relâmpago, pois isso equivaleria a pretendermos explicar o mistério da vida, que é segredo de Deus.
Contentemo-nos em registrar o que ressalta da nossa mentalidade finita, à qual não é lícito ultrapassar as leis reguladoras dos fenômenos.
Limitar-me-ei, portanto, a anotar que, neste caso, tudo contribui para demonstrar que a substância viva, exteriorizada, obedece à vontade do subconsciente do médium.
Daí, importa inferir que, da mesma forma pela qual, graças à vontade do médium, essa substância consegue moldar-se à forma de réptil para alçar-se a balanças e deixar-se pesar, assim também, em circunstâncias outras, ela consegue moldar semblantes humanos, conhecidos do médium, como a demonstrar que o pensamento e a vontade subconscientes são, precisamente, forças plásticas e organizadoras.
Mas isto não é tudo, porquanto, ensinando-nos outras experiências que, muitas vezes, os semblantes materializados são desconhecidos do médium, embora o sejam dos assistentes, conclui-se que a substância viva é capaz de obedecer à vontade subconsciente de terceiras pessoas presentes, ou de lhes sofrer a influência, através do médium.
Finalmente, como circunstâncias outras ocorrem, nas quais as formas materializadas, vivas e falantes, são pessoas já falecidas e desconhecidas do médium e dos assistentes, devemos deduzir que a substância viva exteriorizada é suscetível de obedecer a entidades espirituais de desencarnados, ou – o que vem a dar no mesmo – de sofrer-lhes as influências através do médium.
Isto posto, convém jamais perder de vista as conclusões expostas, mediante as quais constatamos que, se é verdade que a substância viva, exteriorizada, obedece a uma força organizadora inerente ao pensamento e vontade humanas, também é verdade que tais – pensamento e vontade – não pertencem exclusivamente à personalidade integral subconsciente do médium, mas provêm, algumas vezes, dos experimentadores e, muitas outras vezes, de entidades espirituais, de criaturas falecidas.
Desta terceira categoria de manifestações não me ocuparei, visto que o tema aqui versado se prende aos casos em que a vontade organizadora é a do médium e dos assistentes, ou seja, dos vivos.
Autor: Ernesto Bozzano
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